segunda-feira, 28 de agosto de 2017

A GENTE SEMPRE SE REINVENTA

Em certa época da minha vida eu trabalhava como técnico industrial em grandes empresas, percebia salário suficiente aos meus anseios e era feliz, com a minha família e bons amigos. Entretanto, a minha mente buscava alguma forma de estabilidade que eliminasse o risco do desemprego que sempre ocorria nas crises negativas e positivas da economia brasileira. Cursei a faculdade de economia na esperança de que com os conhecimentos do curso eu me tornasse menos vulnerável na grande empresa em que eu trabalhava. Realmente os planos sofreram mudanças e eu acabei sendo convidado para exercer função executiva em uma empresa de menor porte o que me permitiu estudar direito, o que para mim era mais interessante, e fiz o curso que me deu a oportunidade de conseguir a minha estabilidade econômica sem precisar ser empregado de ninguém. Foi um passo importante para quem sonhava em não ficar desempregado. Exerci a atividade de advogado por mais de 20 anos, me realizei tanto profissionalmente como em outros campos da necessidade humana.  Em um belo dia, viajando com a família, filhos já adultos, mas solteiros morando comigo, éramos cinco a cantar e a ouvir músicas no rádio do carro, no tempo do toca-fitas, uma hora de rock pra eles e em outro momento uma MPB para os pais, conforme previamente ajustado, numa alegria imensa indo para alguma cidade turística brasileira onde passaríamos as férias de fim de ano. Tempo bom! Até hoje lembramos.
Vindo de uma dessas viagens, ainda no carro, eu falei que naquele ano de 1997 eu iria deixar de trabalhar como advogado e deixaria o meu escritório, com o prédio próprio, e uma excelente clientela, para os dois filhos mais velhos que comigo trabalhavam, um já estava formado advogado e o outro no último ano. Eu tinha condições de sobreviver sem trabalhar, porque cuidei bem do que consegui ganhar com a advocacia, e isso soou como uma bomba com os dois manifestando um grande medo de assumirem a sua própria história.
Assumiram e foram bem sucedidos mesmo sem a minha presença. Nesse percurso fui economista, fui advogado, fui músico, escrevi livros, pintei quadros, fui político, sempre buscando algo que me fizesse mais feliz.
Aos 74 anos, ainda ávida de novas conquistas, a minha alma irrequieta queria mais e foi ai que encontrei a psicanálise. Encontrei o meu amigo Roberto que é psicanalista há muito tempo, falei da minha simpatia pelo estudo da psicanálise e ele me informou que estava começando um curso desses aqui em São José dos Campos e que havia possibilidade de matricular-me. Fui, entrei, e estou indo para a parte final do curso de 30 meses e sinto que encontrei algo que poderá preencher o grande vazio que seria a minha velhice sem nada fazer. Tenho me dedicado como se fosse nos velhos tempos em que que eu sonhava apenas em não ser um desempregado brasileiro. Sinto que a psicanálise entrou na minha vida no momento mais adequado e está me transformando em uma pessoa melhor, mais equilibrada, mais atenciosa, menos exigente e com capacidade de entender as pessoas como elas são. Em algum momento pensei que corresse o risco de ficar chato, meticuloso, e que me tornasse alguém limitado no convívio social por conta da fama dos analistas. Que bom que nada disso aconteceu, e eu estou aprendendo a conviver com o saber de modo a não assustar pessoas que comigo convivem, e nem provocar nelas o medo de se sentirem analisadas por mim no cotidiano. Que bom que tenho conseguido fazer com que as pessoas sejam apenas pessoas com seus defeitos e virtudes que não são levados à mesa quando se trata de amizade. Que bom que eu terei algo tão importante para me ocupar na velhice que se aproxima silenciosamente sem, contudo, me transformar em uma senilidade inútil. Nos próximos dias começarei a atender os meus primeiros analisandos, e tentarei entregar a eles o que de melhor eu puder realizar.

Ainda bem que encontrei a psicanálise que se daqui pra frente nada mais der certo, já terá dado tudo certo só pelo fato de ter me transformado em alguém, melhor e mais sereno.

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